Os níveis de necessidade de gerenciamento dos recursos hídricos na região
semi-árida Nordestina, conforme os cenários desenvolvidos pelo Projeto
ÁRIDAS (COSTA, 1994; CAMPOS, 1995), situam-se entre 10 e 70%, os quais
sinalizam a urgente demanda por atividades de gerenciamento e realização
de grandes investimentos para a melhoria da qualidade das águas
superficiais e subterrâneas, ampliação da capacidade de armazenamento e
distribuição e ênfases aos estudos de fontes alternativas de ofertas,
de minimização de perdas e de reutilização dos recursos hídricos
escassos disponíveis.
A
região Nordeste do Brasil tem o potencial médio de água doce nos rios
(186,2 km3/ano) representando apenas 3% do total nacional e é,
relativamente, o mais baixo no Brasil. Por sua vez, essa região é a
segunda mais populosa, resultando numa disponibilidade social de água
doce nos rios de 4.384 m3/hab/ano. Entretanto, tem-se aproximadamente
20.000 km3 de água doce subterrânea nos aqüíferos que ocorrem sobre
cerca de 50% da sua área. Vale salientar, todavia, que este valor é
quase o dobro dos encontrados na maioria dos países mais desenvolvidos da
União Européia, e de aproximadamente 12 vezes o que dispõe um
israelense - 370 m3/hab/ano (REBOUÇAS, 1994 e 1996). Entretanto a
distribuição espaço-temporal destes recursos é desuniforme,
principalmente na região semi-árida (Polígono das Secas), onde as
precipitações pluviométricas inferiores a 800mm/ano (PLIRHINE- SUDENE,
1980; SUDENE.BRASIL, 1980; REBOUÇAS, 1996; LÓCIO, 1998).
O
meio rural, marginalizado durante anos por uma atenção sócioeconômica
muito mais centralizada no âmbito urbano, está impotente frente ao
agravamento das fontes causadoras de impactos ambientais negativos: depósito
de lixos incontrolados, contaminação dos rios, escoamento excessivo de
águas residuais e de resíduos agro-industriais, afloramento de lençóis
freático com águas salinas, contaminação da água de abastecimento
para consumo humano e animal, salinização dos solos, entre outros. (SILVA
et al., 1993; SILVA, 1997).
A
qualidade da água subterrânea e da água superficial não podem ser
vistas de forma isolada, uma vez que essas duas fontes encontram-se
fortemente relacionadas entre
si. Os fenômenos naturais e
as atividades humanas, em geral, afetam a qualidade desses recursos. Entre
esse último encontram-se aqueles relacionados aos processos associados as
práticas agrícolas de exploração dos solos, as atividades agro-industriais,
a erosão e ao desmatamento desordenado da vegetação natural decorrentes
da expansão da fronteira agrícola (SHU-LI HUANG & JIUN-JIUN FERNG,
1990; RODIER, 1990; BENEYAS, 1991; VIERA, 1996).
A
água é um dos recursos preponderantes para a determinação da condição
de vida das populações da região semi-árida nordestina. Entretanto, o
baixo nível sócio-econômico característico da região como um todo, em
especial no que se refere a saúde e educação, resulta em um padrão de
exploração do meio ambiente freqüentemente além da capacidade de
suporte, causando impactos negativos sobre a biodiversidade e sobre os
recursos naturais que são a própria base de sobrevivência, num ciclo
vicioso de pobreza e degradação ambiental (CARVALHO, 1990; CAMPOS, 1995;
REBOUÇAS, 1996).
A
qualidade da água do semi-árido depende essencialmente dos resíduos
urbanos ribeirinhos nos grandes reservatórios (barragens, açudes, rios e
lagos) e das atividades mineiras e agro-industriais ao longo dos seus
limites. O desenvolvimento rural e industrial dos últimos anos nas bacias
hidrográficas localizadas na região Nordeste implica no uso de águas
para consumo humano de qualidade inferior ou com risco crescente de
contaminação.
Os
sistemas de produção intensivos elevam a necessidade de uso de agroquímicos,
os quais aumentam os níveis de nitrato, fosfato e as concentrações
residuais dos agrotóxicos, ou de seus metabólitos (resultantes de
processos de biodegradação desses compostos ocorridos no solo), que por
sua vez, podem comprometer a qualidade das águas superficiais e subterrâneas
(salinização, contaminação por agroquímicos, eutrofozação, etc.).
Em decorrência desse desbalanceamento no equilíbrio natural da área,
ocorrem modificações na microflora do solo e alterações no ciclo da
matéria orgânica, com efeitos na relação carbono/nitrogênio (C/N) e
na CTC do solo, assim como favorecimento de fluxos preferenciais para os
processos de lixiviação e
de escorrimento superficial, devido ao manejo inadequado dos recursos hídricos
e do próprio solo, afetando a qualidade da água para consumo.
A deriva
de agrotóxicos, ocorridas durante o processo de aplicação dos produtos,
diminui a eficiência da aplicação, além de comprometimento da
qualidade da flora e da fauna nativas, assim como da água local e de
outras regiões, sem falar da própria saúde do trabalhador rural e de
comunidades vizinhas (contaminação indireta). A ocorrência dessas condições
não tem sido efetivamente estudada no semi-árido nordestino, em grande
parte pela falta de aplicação de métodos científicos apropriados as
características locais, que permitam uma avaliação e um esquema de
monitoramento eficaz da qualidade de água.
Também
se observa a falta de estudos que conheçam e monitorem a qualidade das águas
superficiais e subterrâneas para fins agro-industriais e de abastecimento
para consumo humano e animal em agroecossistemas estratégicos, com o
objetivo de propiciar um nível desejável de qualidade ambiental e de
possibilitar o desenvolvimento de estratégias e medidas preventivas ou
minimizadoras de prováveis impactos ambientais e gestão dos recursos hídricos
por bacia hidrográfica.
Os
indicadores químicos, usados tradicionalmente para o controle de
qualidade da água, deverão ser complementados com novos parâmetros físicos,
biológicos, sociais e ecológicos com base na totalidade das propriedades
do corpo de água em estudo, no caso específico, toda a água subterrânea
e superficial de abastecimento e de drenagem no âmbito de cada bacia
hidrográfica.
Com
base na colaboração direta das Universidades e Institutos Brasileiros, das Empresas de Pesquisa e dos Centro Eco-Regionais da
Embrapa, além das Universidades Espanholas (Univ. Politécnica e Univ.
Européia de Madri), da Fundação Cibeles, do Instituto Nacional de
Investigações Agrárias y de Tecnologia Alimentar - INIA e da Federação
das Cooperativas Valencianas (FECOAV), apoiado no acordo de cooperação
internacional recentemente firmado com a Embrapa, serão estabelecidas as
parcerias para a implementação "in loco", intercâmbio de
conhecimentos na consecução dos objetivos e metas propostos.
O Projeto
Ecoágua prevê o monitoramento da qualidade das águas superficiais e
subterrâneas utilizadas para uso múltiplo no semi-árido, visando o
desenvolvimento dos recursos hídricos na região, com base nas normas
sugeridas pela série ISO 14.000, empregando recursos e mecanismos de
regulamentação natural que asseguram a convivência do desenvolvimento
agrário com a natureza, reduzindo os impactos ao meio ambiente.
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